Estou angustiado com
estas eleições. Para mim, neste 2º turno, o Brasil escolhe entre levar um murro
na cara (Haddad) ou 3 tiros de fuzil (Bolsonaro).
Eu não gosto de rótulos, mas se alguém insiste, para cortar caminho
eu digo que sou de centro, ou de centro-esquerda. Só para constar, no 1º turno
eu votei no Ciro Gomes, e acho que fiz uma boa escolha. Se eu fosse adepto da
economia liberal - e não sou - acho que teria votado no Henrique Meirelles.
Reconhecidamente preparado e competente, ficou com a chave do cofre nos
governos Lula e Temer, e nem sobre ele, nem sobre sua equipe pairam suspeitas
de corrupção. Esses predicados já são convincentes argumentos sobre seu
valor.
Das opções de que
disponho, Fernando Haddad é a que menos repudio. O PT cometeu vários e
injustificáveis erros, incluindo permitir-se herdar nossa histórica corrupção
sistêmica; por outro lado, ousou imiscuir-se no medieval e pornográfico abismo
de desigualdades que, tal qual tradição ou costume, resilientemente continuamos
repassando de geração em geração. Infelizmente, o anti-petismo - considere-o
justo ou não - dividiu o país praticamente ao meio desde 2014, e é promessa de
que não haverá pacificação. Independentemente de ótimas ou péssimas propostas,
Haddad não deve conseguir governar, como se deu com Dilma em seu segundo
mandato, que ela ganhou mas não levou, já que foi imobilizada pelas
pautas-bomba e sabotagem do Congresso que a impicharia. Teremos mais acusações,
delações, panelas, manifestações, patos amarelos... até o quê? Um novo
impeachment? Algum tipo de ruptura não é impensável, e Haddad possivelmente não
terminaria o mandato.
Bolsonaro, em mim,
inspira vaticínios ainda piores.
Ele me remete ao Collor
de 1989: um político desconhecido que de repente vira o super-herói que vai
salvar o país; o candidato que fica em 1º lugar nas pesquisas mesmo sem ir a
debates e sem explicar direito seu plano de governo; Sua arma infalível para
enfrentar os problemas do Brasil? A repetição despudorada de frases feitas,
slogans de marqueteiros e truísmos: Desemprego? "Vamos acabar com a
corrupção!". Saúde? "O Brasil tem que mudar!". Déficit?
"Vamos construir um Brasil novo!". Educação? "O Brasil é um
gigante adormecido!". Segurança? "O povo brasileiro é alegre,
generoso, criativo e trabalhador!"... No final da história, ele vence o
pleito e comete uma série de erros, trocando os pés pelas mãos; só pra começar,
Collor confiscou a poupança... Não que eu ache que Bolsonaro vá fazer isso, mas
espero uma sucessão de equívocos da mesma monta. Ele não explica suas propostas
para resolver as sérias dificuldades que enfrentamos hoje, fica só - para usar
o termo da moda entre seus eleitores - "mitando" na internet e
enumerando nossos defeitos, erros e problemas, sem oferecer soluções; Isso é
mais uma característica que me remete ao Collor de antanho. Lembra do
"Caçador de Marajás"? Dos recados estampados nas camisas usadas para
caminhar? Do Collor praticando karatê, do Collor pilotando jet ski ( então uma
novidade inacessível )...?
Apesar dos quase 30
anos na política, Bolsonaro é ainda menos preparado do que Collor era: só aprovou 2
projetos em 28 anos. DOIS projetos em VINTE E OITO anos! Não venha me dizer que
ele foi oprimido e sabotado pelo "grande sistema corrupto": para usar
uma expressão que seus apoiadores adoram usar contra seus críticos, isso é
mimimi! Nem projetinhos inofensivos e inócuos ele aprovou! Ou ele não tem boas
ideias, ou não se esforçou, ou não tem talento para conversar, debater,
convencer, articular e negociar; ou seja, não é bom de política! Como um homem
que não enfrenta debates eleitorais vai negociar com líderes internacionais a
posição do Brasil no mundo?
O Brasil é um país
continental e complexo, com mais de 200 milhões de habitantes; não pode ser
entregue a um principiante. Bolsonaro nunca foi ministro, governador, nem mesmo
prefeito de uma cidade pequena. Se já seria temeroso fazer essa escolha em
qualquer ano, neste 2018, na esteira dos movimentos de 2013 e de um segundo
impeachment de presidente em 25 anos, encurralados pela crise profunda e
generalizada em que estamos, fazer uma aposta dessas é, pra ficar numa palavra
civilizada, leviano.
Acho que Bolsonaro vai
ser um presidente de papelão, a quem a própria equipe vai manipular. Quem sabe
até já seja motivo de troça entre essa turma, que é quem verdadeiramente
decidirá os rumos do Brasil. Talvez deixem que ele aprove um ou outro projeto
sem muita relevância, como o doce que se dá à criança para que ela não nos
aborreça e deixe-nos trabalhar sem interrupções.
O Brasil já deu um cheque em branco a Bolsonaro, elegendo uma enorme bancada aliada sem experiência ou currículo. Celebridades e YouTubers engrossam o coro de "Mito!". Já que não adianta chorar o leite derramado, desenvolvi uma saudável curiosidade mórbida de ver no que vai dar quando o "mito", inevitavelmente, revelar-se humano e falível.
Lamento o erro
histórico de oferecer patrimônio nacional estratégico ao capital estrangeiro (
petróleo, grandes extensões de terra, Amazônia, Embraer, o SGDC-1 (nosso 1º
satélite geoestacionário), a Base de Alcântara, o setor elétrico... ). Aliás,
essa história de, em evento de um ano atrás em Miami, ele ter batido continência,
emocionado, à bandeira americana, é muito difícil de engolir pra mim. Eu mesmo
tenho admiração, e um sincero e grande carinho pelo povo americano, mas isso
não é atitude aceitável para quem está lá na condição de pré-candidato à
presidência do Brasil...
Já escrevi sobre sua
péssima ideia de facilitar o acesso a armas. No campo, até acho que há espaço
para esse debate; no resto do país, é um equívoco tremendo que deixará gosto de
sangue na boca dos apoiadores da proposta. Vocês acham que só o cabalístico
"cidadão de bem" vai adquirir armas? Os complexados, neuróticos e
machões não vão querer a deles, também? Um assalto na rua, se a vítima reagir,
pode virar tiroteio. Imagine um assalto em um ônibus? Brigas de bar, mesmo
aquelas por causa de futebol e abastecidas por cachaça... E as brigas de casal?
Imagine esses agressores, que já esmurram e esfaqueiam, tendo uma arma de fogo
em casa? Mesmo que não chegue a usá-la, suponhamos o gélido pavor com que
viverá essa mulher, que já passa seus dias sob o jugo do algoz? E se na próxima
vez que ele surtar, um ou dois vizinhos bem-intencionados decidirem apresentar
seus revólveres como argumento de persuasão? O Brasil vai virar um canal de tv
por assinatura que passa filmes de faroeste 24 horas por dia. Chegaremos à
condição de ter saudades do flagelo já vivemos hoje...
Armar a população? Se
até os policiais do RJ, profissionais treinados e calejados, estão morrendo aos
punhados porque não conseguem usar sua arma para se proteger, uma vez que o
outro lado sempre tem o elemento surpresa, imagine o cidadão comum? O próprio
Bolsonaro, quando foi assaltado, teve a arma levada pelo assaltante. E ele é
capitão de nosso Exército!
Expandir as excludentes
de ilicitude? Toda obra humana é passível de aperfeiçoamento, mas se já há
tantas vítimas inocentes na maneira equivocada com que lidamos com o crime,
imagine o que essa "licença para matar" não significará nas mãos
daquela minoria corrupta, mal-intencionada, mal preparada, ou simplesmente
sádica das forças de segurança?
Neoliberalismo
econômico? No Brasil de 2018? Se até o FMI já não teme fazer algumas críticas
ao modelo; se alguns estudiosos já apontam que ele tende a concentrar ainda
mais as riquezas nas mãos de poucos, e que favorece o capital financeiro e
especulativo em detrimento do capital produtivo; Empresas estatais são
ineficientes e corruptas? Veja os maiores escândalos mundiais da última década:
Enron, Lehman Brothers, Bernie Madoff... empresas privadas! Aqui no Brasil,
Odebrecht, OAS e a JBS dos irmãos Batista, empresas privadas! Privatizações são
uma panaceia milagrosa que acaba com todos os problemas como que por mágica? A
Vale do Rio Doce foi premonitória em mudar o nome para simplesmente
"Vale", já que a tragédia de Mariana matou o "Rio Doce" que
a tinha batizado. A telefonia e a internet no Brasil, na sua opinião, funcionam bem e têm
preço justo? 40 anos depois, os britânicos já perceberam que as promessas
neoliberais da Era Thatcher não se materializaram: 76% querem re-estatizar as
ferrovias; 77% querem que o poder público reassuma a eletricidade e o gás; 83%
pedem a volta do fornecimento estatal de água! Eu pergunto: onde estão as
empresas que recusam subsídios? E quando os problemas chegam, como a crise do
mercado financeiro de 2007-2008, não vejo nenhuma empresa ou instituição
financeira recusar o suado dinheiro público que o Estado explorador e malvadão
vem oferecer em seu socorro para evitar um mal maior... Criançada, eis a
edificante moral da história de hoje: "Neoliberalismo no dos outros é refresco!".
Neoliberalismo
econômico? Num país em que as 6 pessoas mais ricas - veja bem, não são 6%, são
SEIS INDIVÍDUOS - possuem a mesma riqueza que a metade - 100 milhões - mais
pobre da população? Falar em "empreendedorismo individual" em um país
que vive o que é talvez a maior desindustrialização na história da humanidade?
Em que a participação da indústria no PIB regrediu aos patamares dos anos 1950?
Falar em "menos Estado e mais Deus" em um país onde metade da
população ainda não chegou ao estágio civilizatório de ter saneamento básico,
fazendo uso de fossas e esgoto a céu aberto? Falar em "meritocracia"
em um país onde 75% da população não tem domínio pleno da leitura e das
operações matemáticas? Neoliberalismo econômico? No Brasil, uma oligarquia
convicta há 500 anos? Lembro-me da marcante e ainda muito válida frase de 1848
do padre, jornalista e educador francês Lacordaire: "Entre os fortes e
fracos, entre ricos e pobres, entre senhor e servo, é a liberdade que oprime e
a lei que liberta". Neoliberalismo econômico? No Brasil de 2018? Esse
modelo seria equivocado, egoísta, nocivo ou suicida, ou ainda alguma
devastadora combinação dos quatro;
O cenário de
destrambelhamentos descrito até agora ainda retrata o melhor que eu esperaria
de uma gestão Bolsonaro. Eu tenho outros medos, muito mais instintivos, quase
primitivos. Vejo, sim!, sinais protofascistas em seu discurso. Eu já
compartilhei anteriormente a lista de "Sinais Incipientes do
Fascismo" de Laurence Britt. Eu identifico todos os 14 sinais na candidatura
Bolsonaro, e ainda acrescentaria:
01. O culto à personalidade;
Cristalino e inegável, chegando ao requinte, inclusive, de adotar um título a
ser usado e repetido pelos convertidos; Se Mussolini era "Il Duce" e
Hitler era o "führer", Bolsonaro é o "mito", e até em
pequenas ações corriqueiras, rotineiramente estaria demonstrando sua
inteligência, capacidade, honestidade e infalibilidade;
02. A promessa de volta a um
intangível "passado glorioso", remetendo a algum período que é visto
sob um prisma nostálgico e parcial que negligencia inevitáveis problemas,
contradições e imperfeições. Para Mussolini, era o Império Romano; Hitler
almejava um Terceiro Reich - um terceiro grande império alemão - sucedendo o
Sacro Império Romano-Germânico e o Império Alemão arquitetado por Bismarck, que
foi da unificação até a Primeira Guerra Mundial. O movimento brasileiro, sem
muitas opções, elegeu - acreditem se puderem - a Ditadura Militar que se
instalou em 1964, mas rotineiramente flerta com Dom Pedro II e seus anos à
frente do Brasil.
03. As ações agressivas e a escalada
de incidentes de violência, praticados por adeptos, e que vão brotando
espontaneamente à medida que o movimento vai ascendendo politicamente; fenômeno
conspícuo com os camisas negras na Itália e os camisas pardas na Alemanha,
também já vemos fatos análogos se multiplicarem pelo Brasil, inclusive -
repetida e lamentavelmente - em universidades.
Sobre o terceiro item
da lista de Britt - a identificação de grupos inimigos como causa unificadora -
vejo incrédulo que os coveiros protofascistas conseguiram exumar e invocar o
fantasma do comunismo! DO COMUNISMO!
Mesmo se ignorarmos que
foi esse o mesmo mantra que permitiu aos conspiradores de 1964 apunhalar a
democracia sob o pretexto de protegê-la, falar de perigo comunista no Brasil de
hoje beira a esquizofrenia; seria cômico, se não fosse trágico. Nós vamos
seguir o glorioso exemplo de quem? Coreia do Norte? Das "malvadas
favoritas" da nova direita brasileira, Cuba e Venezuela? E se dermos
sorte, e alcançarmos a pujança econômica da China? Sim, porque eu nunca vi
ninguém da turma "Nossa bandeira jamais será vermelha!" dar um pio
sobre as relações comerciais do Brasil com nossos queridos irmãos chineses.
Afinal, faz 70 anos que eles lá são comunistas convictos, declarados e
assumidíssimos, e - reparem - de bandeira bem vermelhinha! Esta pode até não
ostentar a foice e o martelo, mas ninguém é perfeito... Para compensar esta
constrangedora lacuna, porém, eles têm a supremacia do Partido Comunista, o controle estatal da mídia
e da internet, e até acusações de violação dos direitos humanos; pacote
"Marx Luxo" mesmo, só na economia que eles se desvirtuaram um
pouco... Que tal vocês, que criticam os "socialistas de iPhone", por coerência e para dificultar o avanço da ameaça vermelha que, nos alertam, já se
infiltrou entre nós, boicotarem os produtos "Made in China", ou
talvez defender o rompimento de relações? Cuidado que o Gramsci te pega,
hein?
Ora, façam-me o
favor...! Nem o "Partido Comunista do Brasil" é comunista, está mais
para social-democrata... Se alguém propuser a revolução proletária, eles vão
pedir moderação e parcimônia! Não que isso seja ruim... O dia em que o PCO
estiver liderando alguma pesquisa eleitoral vocês voltam pra conversar comigo,
combinado?
Em 13 anos de
presidência, quando foi que o PT tentou, ou mesmo falou em socializar algum
meio de produção? Alguma empresa? Algum banco? Ou mesmo criar uma mídia oficial
que verdadeiramente fizesse frente às empresas tradicionais? Estatismo não é
socialismo! O PT favoreceu, sim, "os amigos do rei"; botou, sim, um
monte de gente nas boquinhas do Estado, mamando nas tetas do dinheiro público. Eu vejo, também, que o partido mostra egoísmo na forma como administra sua liderança no campo progressista, e como pode ser implacável ao lidar com fatos que prejudicariam esse projeto hegemônico; essa postura errada vai de coisas como a desleal investida para isolar Ciro Gomes nessas eleições até as suspeitíssimas circunstâncias do assassinato de Celso Daniel, caso que nunca foi satisfatoriamente explicado. Porém, assim como alguém oferecer suborno a um fiscal para evitar uma multa não significa uma tentativa de tomar o poder, os muitos e sérios erros do PT não caracterizam um sistemático e sinistro complô, um bem pensado plano de aparelhamento do Estado, da grande mídia, ou do Judiciário.
O PT comprava o
Legislativo com propinas? Pois se não conseguiu eleger nem o Presidente da
Câmara - e esse atrito com Eduardo Cunha está nos primórdios do impeachment - e
ainda foi defenestrado do poder por ⅔ do Congresso, que deleitou-se em
tripudiar do partido em clima de festa e ao vivo, em frente às câmeras! A
grande mídia? Me diga UM canal de tv aberta que tenha sido crítico ao
impeachment, UNZINHO SÓ! Um dos jornais de maior circulação? Uma das grandes
revistas semanais de notícias que tenha ficado ao menos neutra? Dê uma olhada
nas edições anteriores; pode ignorar o conteúdo, basta passear pela galeria de
capas! O Ministério Público? Mesmo sem obrigação legal, Lula inaugurou a
tradição, abandonada por Temer, de nomear o 1º indicado do próprio órgão para
Procurador Geral da República. O Judiciário? Aquele que não impediu e nem mesmo
protelou o impeachment? O mesmo que não evitou nem adiou a prisão de Lula? O
mesmo que até hoje não pautou a relevante questão constitucional da prisão após
condenação em 2ª instância? Esse é o Estado aparelhado pelo PT, que teria
tentáculos e colaboradores em toda parte?
Pode dormir tranquilo:
ou o PT é um incompetente, miseravelmente incapaz de aparelhar o Estado, mesmo
depois de mais de uma década no poder, ou - e esta é a tese que defendo - ele
nunca nem tentou! Isso é Teoria da Conspiração das mais risíveis! Se você
acredita nisso, perde legalmente o direito de zombar de quem tem medo da URSAL.
Essa turma devia ouvir aquele discurso do Caetano Veloso em 1968, improvisado
diante das vaias a sua performance de "É Proibido Proibir!":
"Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder? (...) São a
mesma juventude que vão sempre, sempre, matar amanhã o velhote inimigo que
morreu ontem! Vocês não estão entendendo nada! Nada! Nada! Absolutamente
nada!"... Companheiros de viagem, "Estudar o passado te revela o
futuro".
Outra característica de
fascistas é, depois de escolher um inimigo e usá-lo como força unificadora,
passar a desconstruí-lo, ridicularizá-lo e desumanizá-lo, rebaixá-lo a menos
que seres humanos dignos de respeito. Isso já tinha justificado a escravidão
desde a antiguidade, e isso viabilizou o antissemitismo. Ou você acha que foi
fácil convencer o alemão médio a desprezar e, então, odiar seus inofensivos e
perfeitamente prosaicos vizinhos judeus? Que foi da noite pro dia? Não. Custou
muito foco e trabalho. Começou com críticas, caricaturas, acusações,
desconfiança, desqualificação; chamando-os de sujos, comparando-os a ratos...
Desumanizar. Não é criticar, não é apontar os defeitos; é diminuir e
desumanizar o outro. Pois você não identifica processo análogo em curso quando,
além de ressuscitar o uso do termo "comunista" como ofensa, há uma
penca de neologismos, ao gosto do freguês? Esquerdinha, esquerdalha,
esquerdopata, petralha, lulopetista, bolivariano, e por aí vai. Outro exemplo é
chamar feministas de "feminazis", e dizer que são feias, peludas e
fedorentas. Quando a opinião política de alguém suscita gritos de "Vai pra
Cuba!", algo está muito, muito mal...
Reconhecer o significado e valor de ter opositores é medular na democracia. Assim como até o pior criminoso ter direito a uma defesa e um julgamento dá legitimidade à Justiça, a existência de opositores é alimento para uma democracia sadia. Se você é cristão, esse respeito ao próximo passa então a ser uma imposição absoluta e inegociável! Eu invoco Mateus 5:43,44
Reconhecer o significado e valor de ter opositores é medular na democracia. Assim como até o pior criminoso ter direito a uma defesa e um julgamento dá legitimidade à Justiça, a existência de opositores é alimento para uma democracia sadia. Se você é cristão, esse respeito ao próximo passa então a ser uma imposição absoluta e inegociável! Eu invoco Mateus 5:43,44
"Ouvistes que foi
dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu, porém, vos digo:
amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem;"
Se os cristãos fossem
cristãos, não teríamos tido o calculado assassinato de pagãos. Em nome de
Cristo, os cruzados estupraram mulheres e mataram crianças. Em nome de Cristo,
católicos queimaram vivos pecadores na Idade Média. Em nome de Cristo,
protestantes enforcaram bruxas no Novo Mundo. Cidadãos de bem, respeitados em
suas comunidades, ostensivamente cristãos, há meros 130 anos atrás, nesta
terra, eram donos de outros seres humanos, a quem chamavam
"escravos", que eles compravam e vendiam, e em quem batiam ou
mandavam açoitar quando se desagradavam deles. Tudo isso enquanto liam a mesma
Bíblia que você, e frequentavam igrejas como a sua. Não subestime a capacidade
de nossa raça de conciliar Cristo com qualquer barbaridade.
Cristãos, se esforcem
para não atirar a primeira pedra! Não sejam como os fariseus, não adianta
limpar o exterior do copo se o interior continua sujo. Tirem o cisco do teu
próprio olho antes de apontar o cisco no olho do teu irmão. Finalmente, cuidado
para não escolher Barrabás! Tenha sempre em mente que não foram os leprosos,
prostitutas e bandidos que crucificaram Jesus; foram as pessoas de bem,
incluindo líderes religiosos, em nome da defesa da tradição e dos bons
costumes!
Alguns eleitores
bem-intencionados de Bolsonaro podem pensar que estou exagerando; que o
fascismo não está pairando sobre o Brasil com um sorriso traiçoeiro no rosto;
que não, não estamos chocando o infame "ovo da serpente"; não
esqueçamos que, longa ou curta, qualquer caminhada, mesmo essa, teria de
começar pelo primeiro passo; que por apelar aos instintos mais primitivos do
homem, na célebre frase de Bertolt Brecht, "a cadela do fascismo está
sempre no cio"; Bernardo Bertolucci nos avisa que o "fascismo começa
caçando tarados"; os mais intelectualmente ambiciosos podem debruçar-se
sobre as 14 características do
"Ur-Fascismo" que Umberto Eco compilou;
Os grandes vilões do
século XX chegaram ao palco mundial apresentando-se como heróis que apontavam
para um futuro melhor. Como reconhecê-los enquanto ainda são mensageiros da
esperança? Guardo comigo uma sugestão que Salman Rushdie deu há 20 anos: que o
crucial seria rejeitar a ideia de pureza; é quando as pessoas começam a
insistir muito em limpeza, seja ela racial, étnica, cultural, ou o que seja,
que é isso que nos conduz à câmaras de gás e extermínio em massa, e que o
século XX nos ensinou que, se alguém tenta simplificar e reduzir a vida humana
até chegar a um único modelo do que é certo e bom, definindo um só jeito de
como as coisas deveriam ser, este é o vilão perigoso, e nós devemos, portanto,
aprender a tolerar e valorizar uma sujeirinha. Não muita, ele brinca; só um
pouquinho...
Há vídeos e áudios de
Bolsonaro dizendo coisas indizíveis. A defesa da ditadura; a defesa da tortura;
a tolerância da morte de inocentes... Proclamando que Dilma tinha que deixar o
poder, "infartada, ou com câncer, ou de qualquer jeito". Não estamos
falando das imprudências de um adolescente impulsivo, postadas no Twitter no
calor de seus 14 anos neste mundo - pobres dessas gerações, que têm sua
imaturidade tão amplamente registrada; São falas de um homem maduro, eleito por
seus semelhantes para legislar sobre sua nação, registradas em ocasiões
públicas e perante conspícuos câmeras e microfones. Bolsonaro dedicou seu voto
no impeachment da presidente Dilma, entre outros, ao torturador Brilhante
Ustra, com quem ela chegou a se encontrar enquanto esteve presa na juventude;
Pois eu acuso Bolsonaro de enunciar, com satisfação, o nome completo do
coronel, reverenciando-o como "o pavor de Dilma Rousseff". Alguém ao
seu lado - creio que um de seus filhos que também é político - move os lábios
acompanhando-o no ultraje, numa provável indicação de que o voto foi ensaiado.
Por maior que fosse sua repulsa, alguém capaz de um ato calculado tão sádico e
desprovido de compaixão, a meu ver, não está apto a governar ninguém, e a ele
não dou meu voto.
Querem agora ouvir um
segredo embaraçoso, uma confissão bem íntima? Para ser completamente cândido,
eu penso que Bolsonaro, em seu despreparo, que é quase ingenuidade,
sinceramente acredita que faria bem ao Brasil. Infelizmente para todos nós,
isso não tem nenhum efeito prático ou maior relevância, e significa
simplesmente que ele mesmo talvez seja uma das primeiras e graves vítimas da
espiral do caos que, eu creio, continuará a se desenovelar. Temo que ele vá
chorar muito no chuveiro. Estes são tempos de escolhas aflitas e dilemas
angustiantes para todos nós desta terra.
Se uma imagem resume
bem o Brasil de 2018, creio que é a estupefaciente e pungentemente triste visão
do Museu Nacional pegando fogo. A estátua de Dom Pedro II, ainda que de costas
- talvez propositadamente assim - parecendo presidir impassível e impotente
sobre o interminável e irrefreável banquete das chamas, estas especialmente fulgurantes
porque cercadas pelo negrume do céu noturno. É como se o Destino, caçoando de
nós, erguesse um espelho diante de nosso rosto e, rindo, pronunciasse a
inescapável sentença: "Eis o que fizeste de si!". Terá sido um parto?
Um eclipse total do sol? Uma ave de mau agouro? Ou seria uma pira de sálvia,
canela e mirra? A nós não é dado reconhecer; só o Tempo o sabe, e só ele
responderá.
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